terça-feira, 29 de março de 2011

CRIATURAS - Histórias de amores e trevas (trecho do livro) @monicacompoesia

Uma taça de vinho do corpo e mais nada. De sangue um brinde a minha inexistência traída e atormentada pela dor de quem em vida nunca passou de uma pessoa perdida entre palavras delirantes e apaixonadas, hoje um Senhor de mortes anunciadas. Um devorador de si mesmo a sorver o sangue alheio pelo simples desejo de uma existência falsa, um ser sedento de uma juventude que nada mais é do que meu próprio instrumento cortante em uma tortura imortal que me rasga o caráter de forma irreversível e fantástica com uma sedutora beleza que sem defesa como presa a todos mata. Um não refletido no espelho caçador de almas, capaz de conceder feito um rei a eternidade mais cruel e ensangüentada como prêmio pelo prazer de se deixar aprisionar em um universo vermelho de dores e lágrimas. Não passo de um fazedor de vitimas dominadas pela vontade inconsciente de lentamente serem assassinadas para que possam em seus próprios corpos, agora estranhos, renascerem como monstros no lodo nojento das suas trágicas trevas internalizadas. Vampiro, eis aqui verbalizada a minha trajetória maldita jamais terminada. Minha primeira mordida não foi premeditada. Foi fruto da ira faminta do meu corpo em estado de morte sem vida anunciada. Sugava o que me devorava, a sede de vida que me faltava. Quanto mais bebia menos me saciava. Só, de dor me dilacerava enquanto um pescoço desconhecido com os meus dentes indecente eu retalhava. Cego, com a boca molhada sedutora sem palavras, despido pela cor do sangue que me banhava estava eu no inicio de uma jornada que não teria fim nem pausa. Rota traçada que me faria exausto, sem parada, um ser sem destino no meio da minha própria estrada. Minha sina já estava revelada nos meus olhos vermelhos de desejo alheios a sofrimento e mágoas. Não me caberia mais a paz na alma no universo das minhas trevas alucinadas. Aprendi que viver para sempre é apenas uma morte cristalizada. Rastejante, sou um herdeiro do nada. Verme andante, cavaleiro errante, caçador de sangue, mordi a mulher que amava. Minha primeira vítima foi também a minha maior praga. Condenado fiquei com a imagem gravada dos olhos de minha amante, mulher encantada, sofrendo no instante em que era por seu amado miseravelmente devorada. Suguei seu corpo e o resto de dignidade que me restava. A matei em meus braços no descompasso da fome que me torturava. Ainda não sabia controlar meus impulsos famintos que por instinto como um felino me estraçalhava. Não consegui salvar da morte, me condenando a sua própria sorte, a mulher que por mim era apaixonada e eu perdidamente amava como quem ama uma flor, perfeita, intocada, doce e mágica. Sabia eu que sem ela não seria nada. E nada sou. Ao matá-la morri nos meus lábios, no nosso abraço, na união dos nossos corpos entrelaçados. Morri com meu eu em sofrimento apaixonado. Quando renasci animal saciado percebi que era eu meu maior condenado. Como poderia um dia por minha consciência ser perdoado? Destruí visceralmente meu passado. Cravei os dentes ferozmente sem fé e noção de pecado na mulher que inocente me amou e desejou estar ao meu lado. Escolhendo errado sentenciou meu futuro a um eterno reviver do passado. Pago com a culpa os meus pecados, repetindo todas as vezes a mesma historia em outros corpos que mordo para sugar a mulher que nunca acho, está morta, viva em meu passado. Rastejo em pedaços pela noite cheio de dor e cansaço. Por onde passo escrevo no cheiro os males que faço. De fome fiz nascer minha maior dor, meu primeiro assassinato. O sofrimento meu companheiro se tornou na escuridão onde todos os dias eu me mato. Fiel a ele eu sou. Parceiro noturno, bebemos silenciosos a dor. Procuro no sangue de cada mulher a que um dia meu animal devorou. Quero amor, mas ofereço desespero e pavor.

5 comentários:

  1. "Destruí visceralmente meu passado. Cravei os dentes ferozmente sem fé e noção de pecado na mulher que inocente me amou e desejou estar ao meu lado..."

    Quantas vezes necessitamos suplantar a dor de sermos rejeitados, por isso, aplaudo este vampiro que em mim sublima a dor humana do abandono. Vivas à Literatura um caminho de construção socila, que indica, medica e liberta.

    Um beijo grande Mônica, bom estar aqui entre teu Vampiros e Anjos, assim ganhamos em escritura.

    Carmen Silvia Presotto

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  2. em tempo corrijo um erro digitado, Construção Social!

    carmen.

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  3. Um texto intenso. Consigo sentir a dor que acomete o eu lírido e toda a problemática que lhe toma: "Aprendi que viver para sempre é apenas uma morte cristalizada".

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    Devo confessar que um dia quero ter uma linguagem tão incrível quanto a sua xD
    Uma semana inspiradora pra você!
    Abraço!

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  4. Sê como Leonardo na própria palavra conta como vivente de suas letras é ótimo saber que podemos viver outras vidas escrevendo o que aprendemos sentir lendo. Talvez Einstein fosse abençoado com o prodígio de visionário com suas fórmulas na sua concepção e ou aplicação. Enfim até coisas de Deus primeiro depois do Homem. Está muito bem escrito gostei bem ìntimo vampiresco.

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  5. Vc escreve bem. Gostei dos livros virtuais ai ao lado tb. Interessante. Acho q vou fazer tb. Será q acerto?
    Bj Laura

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