domingo, 6 de setembro de 2015

O Pequeno (Refugiado)

Ele acordou assustado como fazia todas as manhãs. Correu para abraçar sua mãe. Ele não era filho único. Compartilhava seus medos com os irmãos mais velhos. Sua mãe amorosamente corajosa acolhia a todos. Tudo que ela sabia era que o tempo de sua família se esgotava rapidamente.
O pai cheio de cicatrizes na alma apenas observava. Seu silêncio ardia em brasa diante da indignação de não poder mais lutar contra o sofrimento diário de sua mulher e filhos. 
Nada a eles restava que não fosse a esperança da fuga, a busca quase que desesperada por um outro futuro. Ousaram sonhar.  Pensaram que poderiam viver em paz. Se não aqui, talvez em um outro lugar. Bem distante.
Imaginaram.
Além mar não contavam com a intolerância que os aguardava de braços abertos.
Sonhavam com a acolhida, com o estender das mãos.
Ainda acreditavam infantilmente na humanidade.
Chegaram a uma conclusão. Que para encontrar com o sonho, para vê-lo de perto, de carne e osso, era preciso partir urgentemente. 
Navegaram-se.
Partiram certo dia clandestinamente. Não tinham outra opção que não fosse seguir adiante.
Dolorosa viagem.
Só contavam com a esperança para acalenta-los.
Apesar de tudo mantiveram-se docemente fortes.
Até o impensável.
O navio.
Seus sonhos naufragaram.
Estão sós.
Enquanto o mar impiedosamente abraça a quase todos.
Os que poderiam salvá-los se omitiram. Como fizeram a vida inteira. Como continuarão fazendo.
O pai sobreviveu. Morto em vida. 
Teve sua alma estraçalhada por todas as feridas do mundo com um único golpe.
Dilacerado nada pode salvar. Nem a si mesmo. 
Perdido de dor foi resgatado.
O pequeno não acorda mais assustado. Seus irmãos não compartilham mais do seu medo. Sua mãe já não pode mais acolher a todos. O pai restou. E seu silêncio continua ardendo em brasa bem diante dos nossos olhos...


Moniquinha/ Monicacompoesia

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